Gestores, pesquisadores e representantes de entidades negras participaram do lançamento. Fotos: Cindi Rios/Ascom
“Precisamos instituir um novo marco legal para as políticas públicas sobre drogas que não seja o do proibicionismo, o do inimigo interno, o que existe uma guerra nas periferias e que esses jovens negros que estão morrendo por causa dessa guerra. Eles são muito mais vítimas e alvo, como sempre foi a comunidade negra no Brasil”.
Essas foram algumas das palavras proferidas pelo coordenador-geral do Coletivo de entidades Negras (CEN), Marcos Rezende, durante o lançamento oficial do Observatório Popular de Políticas sobre Drogas (OPPD Racial), na última segunda-feira (5), no Campus I da UNEB, em Salvador.
O OPPD Racial é uma iniciativa desenvolvida pelo CEN, entidade nacional do movimento negro, e apoiada pela Pró-Reitoria de Extensão e pelo Centro de Referência em Desenvolvimento e Humanidades, ambos da UNEB, além da Open Society Foundations. O objetivo é mapear as políticas públicas sobre drogas em 13 estados das regiões Sudeste e Nordeste.
“O Observatório vem para tentar mudar esse estigma que existe na sociedade, para tentar reformular o conceito de política de drogas que não tem atingido os seus objetivos no que diz respeito ao ser humano. A parceria da UNEB vai possibilitar que esse debate chegue em todas as regiões possíveis e necessárias”, avalia Marcos, que é também coordenador executivo do projeto.
De acordo com a coordenação técnica do projeto, o Nordeste foi escolhido para receber as plenárias populares do observatório por ter os estados onde mais cresce o número de mortes de jovens negros. Já o sudeste é a região onde estão as maiores facções de tráfico de drogas do país.
Articulação interinstitucional
Para o reitor da UNEB, José Bites, a iniciativa é importante para que a universidade amplie o diálogo com os movimento sociais e possa contribuir de forma efetiva para proposição de outras soluções que sejam mais efetivas para a conquista de uma sociedade mais justa e pacífica.
“Temos que avançar nessas discussões de forma mais consistente na capital e no interior do estado. Precisamos realizar as audiências públicas e, com o resultado desses esforços, atuar também junto ao poder público, subsidiando-o para para uma mudança radical do contexto que temos hoje”, destacou o gestor.
Pró-Reitora de Extensão (Proex) da UNEB, Maria Celeste Castro avalia que a perspectiva de uma rede de colaboração é consiste em um grande diferencial para a garantia de ampla participação social no processo e dos resultados previstos para as ações do observatório.
Segundo a professora da UNEB Anhamona de Brito, coordenadora técnica do projeto, a universidade respeita o seu caráter democrático e inclusivo ao acolher o projeto, e também garante os suportes técnico e científico necessários para fortalecimento da iniciativa.
“A nossa equipe tem buscado garantir uma prospecção mais robusta dos dados relacionados às políticas públicas que tem interface com as drogas no país. Contamos com todos para ampliar esse debate para as diversas comunidades que dialogam e constroem com a nossa universidade”, salientou a pesquisadora.
De acordo com o presidente do Ilê Aiyê, Antônio Vovô, o projeto vai apresentar uma nova alternativa de abordagem para a redução da violência e das drogas nas ruas. “Vejo essa iniciativa com muita satisfação. Porque há tempos estamos fazendo nossa abordagem, sem nenhum preparo, só pela nossa ótica. Agora com a UNEB e o CEN montando um projeto com essa abrangência incrível, com pessoas capacitadas, acredito que será diferente”.
O evento contou ainda com a participação de representantes governamentais, da União de Negros Pela Igualdade (Unegro) e de outras figuras importantes para o debate racial e a defesa dos direitos humanos.
Metodologia do Mapeamento
O levantamento das políticas públicas será feito em plenárias populares nas 13 capitais dos estados selecionados.
Nessas viagens, garantidas a partir da parceria com a UNEB, a equipe do projeto participará de audiências públicas em assembleias legislativas estaduais, para apresentá-lo às instâncias de Estado, a fim de fortalecer o advocacy (pressão feita nas instituições públicas) e tentar reverter posições conservadoras do Executivo e do Legislativo sobre o assunto.
O projeto terá como produto final uma plataforma digital colaborativa, que terá como objetivo formar uma rede de ativistas negros que debatem o tema em suas comunidades, e levantar informações como estatísticas, projetos, leis, iniciativas diversas, que serão avaliadas pelos pesquisadores do projeto e aberta à consulta pública.
O resultado desse mapeamento será apresentado entre os dias 8 e 10 de dezembro, na capital baiana, em um grande seminário internacional que reunirá ativistas e autoridades no debate sobre drogas para formar um comitê de governança do projeto, responsável por dar encaminhamentos às informações colhidas.
Coletivo de Entidades Negras
O CEN é uma organização da sociedade civil, sem fins lucrativos, constituída com a finalidade de garantir direitos para as populações negras em seus múltiplos contextos e dimensões.
Criado em 20 de abril de 2003, o CEN conta com uma rede de filiados que compreende pessoas físicas e jurídicas, estando presente em 23 municípios baianos e em 17 estados brasileiros. Suas ações têm como público-alvo indivíduos que vivem em situação de vulnerabilidade, excluídos do mercado de trabalho, com baixa escolaridade e sem perspectivas de inserção social.
Entre as missões do CEN, está o combate às desigualdades raciais, o racismo e outras formas de violências e discriminação; defender os direitos e interesses dos povos de terreiro e comunidades quilombolas; preservar e fortalecer a cultura negra brasileira e africana e seu legado civilizatório; além de contribuir com propostas, soluções e alternativas para a melhoria da qualidade de vida da comunidade negra brasileira.